Superstição e peditório
Confesso uma superstição, ao que julgo, comum a muitos benfiquistas: se a àguia Vitória não faz o seu voo direitinho ao seu poleiro de suporte, a coisa não vai correr bem. É sempre assim, e quando assim não é... é a excepção, a tal que confirma a regra!
Hoje a Vitória - tenho uma cadela com o mesmo nome, que também se porta mal com frequência - não quis brindar-nos com aquele voo rectilíneo e seguro, andou por ali às voltas e acabou, eventualmente já cansada, por aterrar na relva, ali no centro do terreno de jogo, mas a 15 ou 20 metros da gloriosa base da gloriosa águia, para desilusão dos mais de 60 mil que enchiam as bancadas, que pouco despois haveriam da dar uma nota de festa na bonita coreografia da reconquista.
Tinha de correr mal, só podia...
Todos os dérbis são especiais. Mas este talvez fosse ainda mais especial. Surgia no meio de uma eliminatória de apuramento para a Champions, a sugerir que a Federação e a Liga não dão muito atenção a essas coisas - pelo menos se for Benfica a estar em causa, porque lembramo-nos bem do que aconteceu o ano passado nos sorteio do campeonato em relação ao Sporting, então a discutir esse apuramento -, e surgia em pleno período do que convencionou chamar convalescença do Sporting.
O dérbi de hoje foi inequivocamente marcado por estas duas circunstâncias. Primeiro porque o Benfica jogou a pensar nos jogos com o PAOK. A pensar - e a jogar - como pensou no jogo de terça-feira passada, mas também a pensar no que aí vem, na próxima quarta-feira. E, depois, porque não quis ser desmancha-prazeres, e não deixou de se associar a este pungente movimento nacional de reabilitação do Sporting, coitadinho, que Bruno de Carvalho deixou dilacerado, às portas da morte.
Durante toda a primeira parte o Benfica preocupou-se em não fazer mal. Não fazer mal ao Sporting, evidentemente. E por isso o jogo não teve então história. Nem mesmo aquela entrada do mal agradecido Ristovski sobre Cervi, a meio da primeira parte, que deixou o argentino a sangrar e de cabeça atada para o resto do jogo, demoveu o Benfica desse incumbimento nacional.
Na segunda parte, parece que o Benfica percebeu finalmente que não lhe competia dar a mão ao mais fraco Sporting que me lembro de ver na Luz. Que não tinha nada a ver com o facto de o Sporting só ter aquilo para dar. Mas, aí, já tinha perdido 45 minutos. E tinha ainda que se ver com as suas próprias debilidades, a maior das quais, como se sabe, tem a ver como Ferreyra não encaixa na equipa, ou como a equipa não encaixa Ferreyra... Vai dar no mesmo. E, como se tudo isso não bastasse, tinha ainda que se ver com a confiança que já tinha dado a Salin, por quem antes ninguém dava um avo.
Como se na primeira parte o Benfica não tivesse já dado tudo para o peditório, quando atravessava o seu melhor período e nos convencia a todos que agora é que é, resolve dar ainda mais um bónus: uma brincadeira de Fejsa acabou numa precipitação de Rúben Dias, oferecendo um penalti ao Sporting. Que o Nani naturalmente não falhou.
Faltava cerca de meia hora para o fim do jogo, e o Benfica atirou-se finalmente para cima do Sporting. As oportunidades sucediam-se, como as defesas de Salin, a lembrar os melhores dias de Rui Patrício. Ia dizer que as substituições de Rui Vitória foram bem feitas, porque o menino João Felix voltou a entrar muito bem e marcou o golo do empate, aos 86 minutos. Mas nem isso se pode dizer, porque a primeira opção foi tirar o Cervi, exactamente quando era o principal dinamizador do jogo do Benfica. E porque Seferovic ... Francamente...
Assim, e com as defesas do Salin, e com um inesgotável cardápio na arte de bem queimar muito tempo (neste particular o Sporting fez bem pior que a grande maioria das equipas pequenas que vêm à Luz) acabou empatado mais um jogo que o Benfica tinha de ganhar. E que, mais uma vez, não soube. Como a águia Vitória tinha anunciado!