Futebolês#129 Encaixe*
Encaixe é certamente o campeão dos homónimos em futebolês. Começou por surgir ao redor do guarda-redes, como se fosse uma linha de baliza ou os limites da pequena área, para significar aquele gesto técnico com que eles transmitem confiança e tranquilidade. Aos seus companheiros e aos seus adeptos!
É aquele gesto de segurar a bola bem apertada entre os antebraços e o peito. Dali não foge! Foi caindo em desuso à medida que os guarda-redes iam perdendo, mais que a segurança, a educação e o cavalheirismo. Em vez de a aconchegar contra o peito e de a proteger, como é digno de uma donzela, passaram a socar a bola ou dar-lhe uma palmada!
Com tão incompreensível mudança de atitude, os guarda-redes mantiveram, mesmo assim, a expressão no seu domínio. Não admira que, quando deixaram de tratar a bola com a ternura e o carinho que merece para passar a agredi-la a soco e à palmada, tivessem deixado de encaixar a bola e passado a encaixar golos. Surgia então um novo homónimo!
Com a financeirização – desculpem o neologismo – que passou a tomar conta do futebol ainda antes de tomar conta do mundo, o encaixeabandonou o domínio dos guarda-redes e passou para o domínio de outros agentes do jogo bem mais importantes: os agentes de jogadores, também chamados, impropriamente, de empresários do futebol. Impropriamente porque, empresários de futebol, só há um em Portugal: Joaquim Oliveira, evidentemente. Jorge Mendes, não. Esse é um agente do jogo, tão claramente que até foi recentemente homenageado por Miguel Relvas por mérito desportivo!
Os clubes passaram a procurar fazer encaixes de qualquer forma, nem que fosse ao murro e à palmada. Nem por isso enriqueceram - isso ficou para os agentes de jogadores – porque logo a seguir a um encaixe gastam como se tivessem feito dez! Isto quando não o gastaram antes de qualquer encaixe, ficando depois à espera de um milagre para ir amortizando pedacinhos de dívida. Como aconteceu ao Sporting. Estas coisas acontecem sempre ao Sporting!
Na época passada gastou à fartazana, e sem qualquer encaixe. A última vez que alguma coisa semelhante se passara tinha sido com uma maçã podre. Não admira, quando são eles próprios a desvalorizar a própria fruta, de que é que estão à espera?
Valeu-lhes na altura que havia alguém tão dado à fruta que nem tinha mal nenhum que fosse podre!
No Sporting, a ânsia de encaixe é tal que venderam o João Pereira com desconto de fazer inveja ao Pingo Doce. Esperar pela valorização do rapaz no europeu? Qual quê?
Espero que não venham a ser acusados de dumping. Não estou a ver o António Salvador a aceitar factura nenhuma, como os fornecedores dos outros tiveram que aceitar…
Mas não se pense que nisto de encaixe tudo o que o Sporting faz é mal feito. Tem também o mérito de ajudar o futebolês, fazendo regressar oencaixe ao domínio do guarda-redes, donde, como vimos, há muito fugira. É para aí, precisamente para o guarda-redes, que agora aponta as baterias de novo encaixe - do único que provavelmente lhe restará – esperando, agora sim, que o europeu lhe acrescente uns trocos. Provavelmente é uma questão de falta de confiança na selecção: acreditam que a baliza da selecção vai ser tão fustigada que alguma coisa haverá de sobrar para o Rui Patrício brilhar.
Mas a necessidade de encaixes não é exclusiva de Alvalade. Na Luz e nas Antas os encaixes são outros, mais vistosos, mas nem por isso menos necessários.
No Benfica, no entanto, ainda só se compra. Não sei se à grande e à francesa, mas por enquanto só desencaixa. Já no Porto é diferente. Ali há gestão de excelência!
O Cebola já foi de borla. Para o Atlético de Madrid, de onde ainda não chegou o encaixe do Falcao. Já para o Hulk é o decalque exacto da estratégia Pingo Doce: 50% de desconto! Ainda não se sabe é se o Abramovich não vai querer descontar o que pagou pelo barrete do ano passado…
* Rubrica semanal do Quinta Emenda