Dez (de) Chalana(s)
Não se adivinhava fácil este jogo de hoje na Luz, engalanada para comemorar o 60º aniversário do nosso mágico, o inesquecível Chalana, a passar mais uma vez por momentos difíceis. Como tanto lhe tem acontecido…
Pelo adversário, o inconstante Nacional de Costinha, capaz do melhor – pôs Alvalade em sentido quando o Sporting respirava os melhores ares do arranque de Keizer, e assustou o Dragão, apesar de tudo - e do pior, reflectido na defesa mais batida da competição, o que leva sempre a desconfiar, mas por si próprio. Pela euforia que indesmentivelmente se sente nos adeptos à volta da equipa e porque, se até agora o desafio era não perder terreno para a frente, agora era o da aproximação decisiva, do penúltimo ataque ao primeiro lugar da Liga, há muito dado por irreversivelmente utópico.
Depois de irrepreensivelmente cumpridos os desafios do início da segunda volta, os tais testes dados por inultrapassáveis por Bruno Lage, este era mais um desafio, mas agora à maturidade competitiva da equipa. Vencida a batalha exibicional, agora era a batalha da consistência competitiva, o velho chavão do estofo, introduzido no léxico da bola há umas décadas pelo mentor da guerra norte/sul. No futebol, e não só…
Pode parecer despropositado começar com esta introdução para escrever sobre um jogo que acabou em 10-0, um resultado invulgar, verdadeiramente excepcional. Histórico!
Não me parece. A envolvência era aquela, e os desafios estavam lá, e eram aqueles. E a resposta foi esta, a confirmar o estofo desta equipa que está a praticar um futebol de sonho. Perfeita, com uma exibição de luxo, coroada com 10 golos. Dez. Do número da gloriosa camisola de Fernando Chalana!
Um resultado de 10-0 não se explica. Saboreia-se. Desfruta-se, responsavelmente. E com humildade. E com respeito, muito respeito pelo adversário. Como o Benfica fez, como fizeram os jogadores e o treinador. A exibição sim, essa explica-se. E explica-se pelo que o Benfica tem vindo a fazer, pelo extraordinário crescimento da qualidade de jogo em apenas um mês. Pela qualidade de jogadores fantásticos que, há um mês, não passavam de jogadores banais, perdidos em campo sem saber o que fazer, incapazes de correr, ou sequer de saber para onde correr. Se pudessem...
Poderá dizer-se que um golo na bola de saída, aos trinta e poucos segundos, ajuda. Sem dúvida nenhuma que é melhor começar o jogo a ganhar que a perder. Mas todos nos lembramos que, há muito pouco tempo, também o Benfica entrou a ganhar no jogo com o Moreirense, na Luz. E do que se seguiu…
O golo no pontapé de saída, que começou a ser construído a partir da defesa, não foi um incidente do jogo. Foi a afirmação da qualidade do jogo que está implementada, da vontade da equipa em iniciar o seu trabalho logo ao primeiro segundo, e da consciência do que estava em jogo, conforme aquela introdução inicial, não tão despropositada quanto poderia parecer.
A partir daí tudo foi fácil. Fácil e muito bonito, porque são as coisas fáceis que fazem o futebol bonito. Ora em jogadas envolventes, com requintes técnicos de arregalar, pela direita, pela esquerda ou pelo centro; ora em passes a rasgar a estrutura defensiva adversária a solicitar desmarcações de laboratório; ora em lances de bola parada, que agora dão golo, ou muito perto disso. Sempre assim, 90 minutos assim…As oportunidades de golo sucederam-se a um ritmo alucinante. E os golos a metade desse ritmo: Grimaldo, Seferovic (duas vezes), João Félix, Pizzi, Ferro, na estreia a titular, Rúben Dias, Jonas (também por duas vezes), no regresso à equipa, e Rafa…
E aí está, a um ponto do primeiro lugar. Há um mês eram sete!
A reconquista de 2014 começou com onze Eusébios. A de 2019 arrancou com 10 Chalanas… Porque o Odysseas, que até garantiu o zero, não tem o número 1. Se o tivesse, o seu 1, como 0 que garantiu, também dava 10!